sábado, janeiro 20, 2007

Há quase 25 anos...

é verdade, há quase 25 anos, pelo menos, que andamos nisto de despenaliza, não despenaliza, Sim e Não e muita conversa fiada.
Há quase 25 anos, no dia 3 de Abril de 1982, Natália Correia pôs a AR a rir de tal forma que os trabalhos tiveram que ser interrompidos. E porquê? Porque à frase do deputado João Morgado do CDS - "O acto sexual é para ter filhos." - a poetisa deputada respondeu em forma de poema:

Já que o coito - diz Morgado -
tem como fim cristalino,
preciso e imaculado
fazer menina ou menino;

e cada vez que o varão
sexual petisco manduca,
temos na procriação
prova de que houve truca-truca.

Sendo pai só de um rebento,
lógica é a conclusão
de que o viril instrumento
só usou - parca ração! -
uma vez. E se a função
faz o órgão - diz o ditado -
consumada essa excepção,
ficou capado o Morgado.


Em 25 anos quantas mulheres recorreram ao aborto? Quantas ficaram impossibilitadas de voltar a engravidar ou morreram pelas más condições em que o fizeram? A lei impediu-as?

Felizmente para mim, nunca fui obrigada a recorrer a tal prática. Sou pela vida, quando essa vida tem condições para decorrer dentro da normalidade. E reconheço que a normalidade para mim, pode ser muito diferente da normalidade de outros. Para mim significa planear, não correr riscos que impliquem a vida inocente de um novo ser humano. E, por isso mesmo, tive dois filhos exactamente quando os desejei, planeei e fiz. Provavelmente também porque tive a sorte de não me correrem mal os planos.

Quando as coisas correram mal a amigas minhas acompanhei-as, ajudei em tudo o que me foi possível. Também a interromperem a gravidez se conscientemente assim o desejavam. E conheço as diferenças entre abortar às escondidas e abortar numa clínica em Mérida (Espanha) com acompanhamento médico e psicológico. É um abismo de diferença. Também nas consequências. E sim, também nas lágrimas que o tempo eventualmente secará. A tristeza de abdicar de um filho, com ou sem medo, deixa sempre marcas numa mulher. Mas um aborto feito sem dignidade pode marcar o corpo e a alma de forma indelével.
A minha parca experiência leva-me a respeitar as decisões de outros em relação ao seu corpo e à sua vida, em relação ao que é melhor naquele momento para si mesmos e para uma nova vida que está em formação. Entendo que uma mulher não queira ter um filho com Trissomia 21, por exemplo, entendo que não queira ter um filho que não pode sustentar. Entendo quem os queira ter. É um direito de cada um! Quanto ao feto, tem o direito de ser desejado e amado e educado com total disponibilidade por parte dos pais. Tem direito à vida com qualidade!
Por tudo isto vou votar SIM à despenalização da IVG. De consciência tranquila! Porque acredito que, com a educação e informação correctas, cada mulher sabe o que é melhor para si e para os seus! Porque acredito que a grande maioria das mulheres não faz um aborto de ânimo leve!

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